Ted Lasso, a complexidade do ser humano e o futebol como metáfora para a vida

Thiago Ferreira Coelho
3 min readJul 6, 2023

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Comecei a terceira temporada de Ted Lasso, série da Apple TV (e também disponível em sites piratas, não que eu endosse essa prática). Se você já chegou ao Último episódio (com U maiúsculo mesmo, já que essa foi a temporada derradeira), não me conte o final. Se você nem sabe do que se trata, a dica vai ao longo dos próximos parágrafos.

A série leva o nome do protagonista, vivido aqui por Jason Sudeikis (que fez “Uma Família do Bagulho” com a Jennifer Aniston. Divertidíssimo, também recomendo), um treinador de futebol americano universitário que recebe uma proposta para trocar a bola oval pela redonda e se muda para Londres, onde tem a missão de evitar o rebaixamento do AFC Richmond para a segunda divisão do campeonato inglês. Pesam contra o time: a dificuldade de relacionamento entre os atletas, a mágoa da proprietária pelo ex-marido e antigo dono do clube, e o total desconhecimento de Ted pelas regras do esporte jogado com a bola nos pés.

Cartaz de divulgação da série Ted Lasso. Em primeiro plano, o personagem título, olhando para cima e com um sorriso confiante. Ao fundo um estádio de futebol, com as arquibancadas na cor azul, mas assentos pintados de vermelho formam a palavra BELIEVE (“Acreditar”, em inglês)
“Acredite”

Ted é o nome escolhido pela proprietária, Rebecca Welton (interpretada pela atriz Hannah Waddingham), como um gesto de sabotagem. Após o fim traumático de um casamento com o antigo dono do Richmond, a vingança tramada por Rebecca é contratar um estrangeiro inexperiente para machucar a verdadeira paixão do ex-marido: o clube de futebol pelo qual ele havia se devotado durante anos. Mas o treinador Ted Lasso compensa a falta de noção tática (ou qualquer noção do esporte que ele chamava de soccer) com aquilo que tem de sobra: o talento para compreender e lidar com outros seres humanos, extraindo — dentro e fora do campo — o melhor de cada pessoa. O carisma, o bom humor e o otimismo quase infantil do treinador levam o Richmond a vencer algumas partidas enquanto Ted conquista críticos que incluem jogadores, torcida, imprensa e até a própria chefa que deseja o ver fracassando.

As lições de Ted Lasso sobre liderança, empatia, trabalho em equipe e gestão de pessoas muito provavelmente já estão no LinkedIn e em discursos de coaches das mais diversas áreas. Se você gosta desse tipo de conteúdo, provavelmente vai gostar da série. Mas se você torce o nariz para esses assuntos, calma: o seriado não é sobre isso. Não é sequer sobre futebol. É sobre gente e sobre a complexidade de cada ser humano. Pessoas e seus conflitos, sonhos, esperanças, dificuldades e problemas. O próprio Ted, por trás do otimismo e do bom humor, é uma pessoa que precisa aprender a lidar com perdas pessoais e com crises de ansiedade. Rebecca é uma mulher com necessidade de se reconectar com quem ela era antes das frustrações de um relacionamento que a deixou magoada. Além deles, também aprendemos a nos importar com pessoas como a influencer e namorada de jogador Keeley Jones, o talentoso e individualista jovem atacante Jamie Tartt, o veterano ranzinza Roy Kent (“He’s here! He’s there! He’s every fucking were!”), o nigeriano idealista Sam Obisanya, ou o roupeiro promovido a treinador assistente Nate Shelley.

Todas essas histórias são contadas com delicadeza tanto nos momentos dramáticos quanto nos momentos de humor, com direito a trocadilhos e referências a comédias românticas e a cultura pop em geral (hoje em dia, parece que isso é quase obrigatório). O episódio de Natal (o quarto, da segunda temporada) já está entre meus momentos favoritos de todos os tempos na dramaturgia. E não apenas eu fui cativado: sucesso de público e crítica, a série Ted Lasso quebrou a quarta parede e o AFC Richmond, embora seja uma agremiação fictícia, teve sua linha de uniformes lançada pela Nike no mundo real, e a equipe é um time que pode ser escolhido no jogo FIFA 23.

O futebol acaba sendo um bom pretexto para desenrolar as histórias do seriado, e as cenas em estádios conseguem captar bem a atmosfera do esporte. Ou, mais que apenas um bom pretexto, é a metáfora ilustrada na frase constantemente repetida pelo atacante mexicano Dani Rojas: “futebol é vida”.

Em primeiro plano, fora de foco, um dos jogadores do AFC Richmond observa Ted Lasso, com foco e ao fundo apontando para o cartaz com a palavra “BELIEVE” (“Acreditar”, em inglês) afixado acima da porta que separa seu escritório do vestiário do time
“Acredite”

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Thiago Ferreira Coelho
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Written by Thiago Ferreira Coelho

Eu não sei escrever, mas escrevo. E não é contradição: disse que me equivocaria, como me equivoquei tive razão.

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